sexta-feira, 6 de junho de 2008

Síntese: Jesus, o Libertador (Jon Sobrino)


Parte I: Método da Cristologia Latino-Americana


I-Uma nova imagem e uma nova fé em Cristo

O Cristo das maiorias pobres é o Cristo sofredor da Semana Santa. É a figura de maior identificação popular. Ocorreu porém uma mudança nos últimos anos e este mesmo. Cristo passou a ser também símbolo de protesto e de libertação. Essa nova imagem relevante para o contexto de opressão e miséria da América Latina. É uma imagem essencialmente soteriológica, porque Cristo é o libertador de todas as opressões. Essa nova imagem corresponde a uma nova forma de se viver à fé, com compromisso e testemunho até a entrega da vida. Esse Cristo e essa fé são conflitivos, já que Jesus está a favor dos oprimidos e conta os opressores. Por ser contrária a imagem tradicional alienante fomentada pelos poderosos para manipular a consciência dos pobres. Uma imagem de Cristo-poder, serve para justificar o poder autoritário opressivo. Um Cristo reconciliador é perigoso porque nega Jesus de Nazaré, sua denúncia profética e sua defesa dos pobres. É livre de conflitos. Um Cristo absolutamente absoluto: ignora a relação histórica entre Jesus e o Reino de Deus e o Deus do Reino. Abandona a realidade histórica à sua miséria. Lembramo-nos de que séculos da fé em Cristo não foram capazes de mudar a realidade. As novas imagens supera as anteriores e mostra a quem elas servem, por isso é conflitiva.
Imagem de Cristo em Medellín: Cristo é aquele que vem para libertar de todas as prisões, opressões e injustiças. Ele amou os pobres e viveu na pobreza. Sua história é descrita a partir da pobreza e da sua opção pelos pobres. Capta-se a presença de Cristo na história através do anseio pela redenção total e pelas conquistas transformadoras.
Imagem de Cristo em Puebla: Cristo quis identificar-se com os pobres, com os mais fracos. Puebla privilegia sua presença nos pobres que são os destinatários privilegiados de sua missão, é a eles que Cristo se dirige em primeiro lugar. Por isso para se ter um conhecimento de Jesus é necessário conhecer os pobres. São um sacramento de Cristo, porque por sua vivência de valores evangélicos nos chamam à conversão.

II- O lugar eclesial e social da cristologia

Para a cristologia latino americana o lugar teológico é a realidade histórica na qual se crê que Deus e Cristo continuam se fazendo presentes. Seu lugar são os pobres desse mundo. A escolha deste lugar é uma exigência captada quando já se está nesse lugar. Quando Igreja e pobres são postos em relação essencial, então surge a Igreja dos pobres. A fé da Igreja dos pobres se realiza sobretudo como prática libertadora, seguimento de Jesus. Em sua opção pelos pobres, profetismo e destino. Conhecer Cristo é segui-lo.

III- O Jesus histórico ponto de partida da cristologia

Relação entre Jesus e Cristo: Não se trata apenas de aceitar na fé o prodígio do dom de Deus se ter tornado humano. Esse prodígio não é outro senão o Jesus de Nazaré concreto, por isso pode a cristologia começar por baixo. Para chegar a confessar com sentido que Jesus é o Cristo é preciso conhecer Jesus, conhecer e analisar aquelas realidades suas que permitam dar o salto da fé: Jesus é o Cristo. Lembremo-nos de que uma das primeiras dificuldades da fé em Cristo não era a afirmação de sua transcendência, mas de sua humanidade. O proceder mais concreto é ver Cristo a partir de Jesus, para que não se corra no perigo de confessar o Cristo contrário a Jesus.
Diversos pontos de partida:
1- Não se pode partir de afirmações dogmáticas e conciliares. Essas fórmulas não dizem mais nem vão além das Escrituras e pressupõem algo prévio: a própria Sagrada Escritura.
2- Há também a abordagem bíblico-dogmática, que parte dos títulos. Possue uma linguagem mais acessível, mas já apresentam títulos teologizados que supõem uma realidade anterior: Jesus de Nazaré.
3- Partir do querigma, mas esta abordagem apresenta a dificuldade de se garantir um conteúdo concreto com existência autêntica.
4- Partir da ressurreição também é complicado porque é preciso saber quem é o ressuscitado.
Nas cristologias atuais há uma volta ao Jesus de Nazaré. A cristologia da libertação surge da necessidade de se responder aos desafios do continente, com uma clara necessidade de se retornar a prática de Jesus. É por isso que ela se antepõe o Jesus histórico ao Cristo da fé. Por Jesus histórico entende-se a vida de Jesus de Nazaré, suas palavras, sua prática e seu destino: a história de Jesus. Prosseguir a prática de Jesus é o que nos faz aprofundar a fé em Jesus. Chega-se melhor ao seu interior a partir de sua prática. Além disso, fora do seguimento não se tem afinidade suficiente com o objeto de fé para saber de que se está falando ao confessa-lo como o Cristo.

Parte II: Missão e fé de Jesus

IV- Jesus e o Reino de Deus


Jesus não fez de si mesmo o centro de sua missão, pregava o Reino e o Pai. O Reino de Deus era a realidade última para ele. O Reino era uma certeza, sua vinda é fruto do amor de Deus, é gratuidade, mas não se opõem as ações, antes a exige. A chegada do Reino é a boa notícia, é Deus que se aproxima porque é bom e quer o bem para os homens. Destinatário: o Reino de Deus é para os pobres. Ninguém estava excluído de entrar nele. Mas Jesus compreende sua missão como dirigida aos pobres. Pobres pelo simples fato de serem pobres, não importa em que situação moral ou pessoal se encontrem: Deus os ama e os defende, são os primeiros destinatários da missão de Jesus. Pobres são os “anawin”, curvados sobre o peso de alguma carga, e que hoje poderíamos traduzir por pobres economicamente. São também os desprezados pela sociedade vigente, pecadores, publicanos, prostitutas, os sem dignidade, excluídos socialmente. São os que estão embaixo da história, uma realidade coletiva e massiva: grupos ou classes. O Reino é parcial, porque se dirige em primeiro lugar aos pobres, eleitos por Deus. Anunciar uma boa notícia aos pobres desse mundo não pode ser feito apenas com palavras, mas com a prática, com a luta, porque de palavras eles já estão cheios. Reino não é só conceito de sentido, mas conceito práxico. Os milagres de Jesus são sinais de proximidade do Reino que geram esperança. Neles os pobres vêem a salvação e é a partir deles que se deve entender os milagres. São também uma amostra da misericórdia de Jesus diante do sofrimento dos pobres e dos fracos. Não apenas sentimento mais reação prática. A expulsão de demônios: a vitória sobre o maligno. Maligno: dimensão última do anti-reino. Demônios eram enfermidades físicas e psíquicas que geravam sofrimento. A aniquilação do maligno mostra que o fim dos sofrimentos está próximo. A vinda do Reino implica luta ativa contra o anti-reino. Ambos são opostos e excludentes. Acolhida dos pecadores ou perdão dos pecados. Em primeiro lugar Jesus acolhia os pecadores como um sinal da vida do Reino e não como uma forma de mostrar seu poder. Oferece a salvação para todos e para todos tem exigências. Quer mostrar um Deus amoroso. A acolhida expressa a libertação do pecador, devolve a dignidade aos desprezados. A reação do anti-reino. A acolhida e o perdão contra a lei escandalizam, bem como a parcialidade e a gratuidade de Deus porque abala a sociedade religiosa oficial. O Reino de Deus na Cristologia Latino Americana. Libertação é entendida como libertação dos pobres. A totalidade é vista a partir daqui. O Reino de Deus é visto como a libertação dos pobres, a realidade última e escatológica. A instalação do Reino visa a erradicação do Anti Reino. Os bens, a salvação, que Jesus traz são contradição diante do Anti Reino. Um age contra o outro. O Reino de Deus é para os não pobres na medida em que se abaixam para os pobres, são capazes de defende-los e se deixam imbuir pelo Espírito dos pobres. O Reino de Deus é vida justa para os pobres, boa notícia para milhões de pessoas e leva a denunciar o anti-reino.

V- Jesus e Deus

Jesus diante de um Deus Pai: A radical experiência de Deus que Jesus teve foi absolutamente central em sua vida. Suas noções sobre Deus provinham de diversas tradições. Ele faz uso da tradição profética segundo a qual Deus aparece como parcial e defensor dos oprimidos. Quando fala sobre o futuro absoluto de Deus, Jesus está se baseando na tradição apocalíptica. Quando enfaixa um Deus criador providente que cuida de suas criaturas e vela por suas necessidades cotidianas está se inspirando na tradição sapiencial. Todas essas tradições se referem ao Antigo Testamento.
A oração de Jesus: A oração de Jesus mostra que Ele se dirigiu a Deus e a que Deus se dirigia. Como judeu piedoso era de se esperar que Jesus orasse, toda sua vida transcorria em clima de oração. Não é um orante ingênuo: conhece a oração mecânica, a oração vaidosa e hipócrita, a oração cínica, a oração alienante e opressora. Mesmo com esses perigos Jesus insiste na oração. Sua oração aparece como confiança em um Deus que é bom e é Pai e como disponibilidade diante de um Deus que continua sendo Pai. Jesus está convencido de que o que define Deus é a sua bondade. Deus é “Abba” que deseja o bem dos homens. E Jesus passa fazendo o bem, concretizando a vontade de Deus. Sua bondade tem que ser descritas como amor (ágape). Essa visão de Deus como amor e ternura constitui o núcleo de sua experiência de Deus. Sim, Deus é absoluto e transcendente, mas não é autoritário e opressor. Jesus ensina por palavra e obras que autoridade é serviço em liberdade. É liberdade em função do bem de outros. De tudo o que se viu acima se conclui que Jesus via em Deus alguém em quem se poderia confiar e descansar, que dá sentido à existência dos homens.
Disponibilidade para um Deus que é Pai: Foi uma relação de disponibilidade e não de posse. A obediência de Jesus foi uma atitude fundamental ou fundante em sua vida, uma disponibilidade ativa para Deus, a cuja palavra devia estar sempre atento e aberto. Foi um sair de si mesmo. Em certo sentido pode-se dizer que Jesus se converteu na medida em que seu Deus foi se movendo e movendo a Ele, na medida em que ele se deixou mover por Deus. Tentações: As tentações de Jesus querem dizer que sua conversão a Deus se realizou através da prova. Mostram a sua verdadeira humanidade. As tentações versam sobre a forma de exercer o messianismo. Crise Galilaica: Jesus teria passado por uma crise que dividiu sua vida em duas etapas. A ruptura geográfica demonstrada por sua ida a Cesaréia de Filipe mostra que ele tinha dúvidas sobre o valor da continuidade de sua missão. Ignorância de Jesus: Jesus respeita a transcendência de Deus, por isso o seu não saber não tem nada de imperfeição, mas expressa sua criaturidade. Também é conseqüência de sua humanidade a fé. Quem é Deus para Jesus? É aquele a quem Jesus responde e corresponde. È de tudo garantia do sentido de sua vida e no qual ele pode descansar.

VI- Jesus e Deus

A práxis profética de Jesus como defesa do verdadeiro Deus. Práxis profética. Jesus denuncia todos os que tem em comum o fato de representarem ou exercerem algum tipo de poder que oprime. Diretamente denuncia e desmascara o anti-reino que configurava (e configura) a sociedade matando muitos seres humanos. Desmascaramento. Jesus constata que os homens não só tem visões distintas e contrárias de Deus mas também usam essa visão para defender seus próprios interesses. Daí a necessidade dos desmascaramentos de todos os mecanismos da religião opressora. Denuncias: Denuncia os ricos porque a riqueza é má em primeiro lugar para eles mesmos porque faz com que ponham o coração somente nelas; é impossibilidade de abertura do homem para Deus e é condenação porque os ricos já tiveram seu consolo. A denúncia da riqueza é clara, embora na história se tenha buscado todo tipo de subterfúgio par suaviza-la. A riqueza age contra os pobres e contra Deus. Jesus profeta: Jesus não nos é apresentado diretamente em confronto com os poderes políticos dominantes, nem toma central em sua crítica a dominação romana. Sua mensagem central é a defesa dos oprimidos. Idolatria na Teologia da A.L.: A teologia da A.L. leva muito a sério as questões de idolatria, porque vê nela não apenas perversão ética, mas teologal. É por isso que fala em ídolos em sentido real e não figurado, como realidades de morte. O Deus Pai de Jesus é antagônico e está em luta com os outros deuses. Por isso a fé tem que ser autodolátrica, tem que ser práxica e responder a vontade de Deus. Tem que ser realização da misericórdia , da justiça e do amor. Esse Deus tem um lugar privilegiado na história: o rosto dos pobres e oprimidos, por isso a fé tem que ser encarnada e parcial.
Porque matam Jesus? Não há dúvidas de que Jesus morreu violentamente. Seu final foi fruto de uma perseguição sustentada e progressiva por parte dos fariseus, saduceus, herodianos, escribas e sumos sacerdotes, todos com algum tipo de poder. Todos convergem na perseguição. O povo de Deus não apareceu como responsável pela perseguição. Este por vezes até lhe serviu de defesa.
Causas: As denúncias de Jesus contra o poder opressor, diretamente o poder religioso, que sustentava e justificativa outros poderes. Ataca aqueles que justificavam a opressão em nome de Deus. Ao ataca-los, defende suas vítimas.
Consciência: Certamente que Jesus devia ter consciência de seu final trágico. Sabia que Herodes, o Sinédrio e os romanos tinham poder para matá-los, mas manteve-se firme. Viu o trágico fim de João. A morte violenta virá como algo sempre presente no horizonte. Sua entrega foi plenamente livre, expressão do seu amor. Vê que é preciso continuar caminhando com Deus na história. Faz seu último gesto de serviço para deixar o exemplo.
Julgamento religioso: Os artífices de sua morte foram certamente os da corte sacerdotal irritados com a ação transformadora de Jesus. Parecia razoável que fosse condenado por destruir o templo.
Julgamento político: Jesus morreu com um tipo de morte que só cabia aos romanos condenar. A causa, ou melhor, a condenação foi por se fazer passar por “Rei dos Judeus”. Foi uma condenação em nome da “Pax Romana”. Na realidade, Jesus era tão perigoso porque a partir do religioso se abalam alicerces da sociedade de maneira radical.
Morte como conseqüência de sua missão: A morte de Jesus foi conseqüência de sua vida, de sua ação em defesa das vítimas do anti-reino.
Por que Jesus morre? Morre para nos mostrar o amor de Deus de maneira inequívoca. O próprio Deus tomou a iniciativa de se fazer presente em Jesus, e a cruz é aquilo em que o amor de Deus aos homens se expressa e se torna real. A linguagem de amor vai além de redenção ou de salvação dos pecados: o amor salva e a cruz é expressão do amor. A cruz nos diz que Deus veio a esse mundo, que é um Deus conosco e um Deus para nós, à nossa mercê.

IX- A morte de Jesus

O Deus crucificado: Silêncio de Deus na cruz. Jesus não morre com a sabedoria de Sócrates nem com a tranqüilidade estóica de Sêneca. Sua morte não é descrita de maneira bela e tranqüilizadora. Sua morte trágica mostra uma descontinuidade radical em sua vida. Essa descontinuidade é real e constitui a tragédia objetiva e específica da morte de Jesus. Nas narrações da cruz de modo algum apareceu a proximidade com o Reino que Jesus pregava. O final de sua vida terminou no silêncio de Deus, sem sua presença ativa. A única coisa que a cruz diria é que o próprio Deus carrega o sofrimento e que é preciso carregá-la. O sofrimento de Deus é bem verossímil se Ele realmente quis revelar sua solidariedade par com as vítimas deste mundo. Se, desde o princípio do Evangelho, Deus aparece em Jesus como um Deus conosco e para nós, na cruz ele aparece como um Deus à mercê de nós e, sobretudo, como um Deus como nós. O sofrimento de Deus na cruz diz que Ele luta contra o sofrimento humano, que quis se mostrar solidário para com aqueles que sofrem e que sua luta contra o sofrimento é à maneira humana.
Vítimas como lugar de revelação: As vítimas deste mundo são o lugar do conhecimento de Deus, o fazem presente. Estar ao pé da cruz de Jesus é estar ao pé das cruzes da história, é absolutamente necessário para conhecer o Deus crucificado. Na A.L. é preciso estar junto deles de maneira especial para baixá-los da cruz.

X- A morte de Jesus

O povo crucificado: Olhando de terceiro mundo percebe-se que existem cruzes não só individuais, mas coletivas, de povos inteiros. Povos crucificados não padecem somente de pobreza, mas são mortes das mais diversas maneiras. Esses povos completam em sua carne o que falta à paixão de Cristo. São as presenças atuais de Cristo na história. São também mártires porque respondem ativamente ao anti-reino, porque carregam seus pecados e são as maiorias sem defesa, mortas em massa, inocente e anonimamente.

Bibliografia
Sobrino, Jon. Jesus, o Libertador: I. A história de Jesus de Nazaré. Vozes: São Paulo, 1994.

2 comentários:

Anônimo disse...

Bom dia Papagaio!!!!!
Estou copiando o texto que achei muito bom. Gostaria de saber onde encontro o cap. 7 e 8. vejo que o resumo não´possue. Obrigado até mais. se possivem responda como comentário.

Facilitando a Teologia disse...

Bem...

Não tinha reparado, mas o texto está realmente incompleto. No entanto é o que recebi em mãos, espero que possa ajudar!